domingo, 27 de abril de 2008

OS SENTAIS ESTÃO SE TORNANDO MUITO INFANTIS?







Há algum tempo, os fãs de Tokusatsu brasileiros vêm presenciando um fenômeno curioso com o gênero Super-Sentai e suas séries, lançadas anualmente: as séries atraem cada vez mais, públicos de idades menores.
A discussão a respeito da infantilização dos Super-Sentais já é antiga e famosa, entre os tokufãs brasileiros (e provavelmente mundiais). A cada série lançada, percebe-se uma mudança de características e tendências que fizeram do Super-Sentai, um dos gêneros mais populares de Tokusatsu em todo mundo. Essas inovações desagradam em grande parte, camadas de fãs mais saudosistas, que discordam das políticas de produção dos seriados lançados atualmente. Por outro lado, as novas séries Sentais agradam cada vez mais, adolescentes, jovens em idade escolar, e crianças em geral, que não puderam ter contato com os seriados Tokusatsu no auge da TV aberta nacional, e por isso, alcançam os programas através dos novos meios de propagação em massa (Internet, TV por assinatura, DVD´s).
Em meio ao fogo cruzado de interesses entre públicos tão diferenciados em relação ao gosto pelo gênero Super Sentai, a pergunta base desse artigo produz cada vez mais curiosidade. Afinal…O que está ocorrendo com as séries Sentai? Porque a idade do público telespectador de Sentais está cada vez mais baixa? Seria possível, que as séries Sentai estivessem se tornando mais…infantis?
O leitor já pode ter uma opinião própria formada a respeito desse assunto, que como já citei, não é inédito. Mas as respostas a esses questionamentos não estão contidas apenas em uma única justificativa. Para que se possa fazer uma análise justa e ética, é preciso abordar um pouco a história do gênero Sentai, e sua atual situação na TV japonesa.
O gênero Sentai, foi criado pela TOEI no final da década de 70 (1976, mais exatamente). É um dos gêneros de Tokusatsu mais antigos das telas japonesas, sendo superado em idade, provavelmente apenas pelo gênero Ultraman, produzido inicialmente a partir do final dos anos 50, e início da década de 60. A primeira série Sentai exibida pela TOEI nas telas do Japão foi Goranger.

A revolução foi imediata. Todos os seriados Tokusatsu exibidos até meados da década de 70, giravam em torno de apenas um herói principal, que fazia uso de seus poderes de maneira solitária. O gênero Sentai foi criado como uma forma de variação das séries Tokusatsu, onde vários heróis podiam lutar em prol da justiça juntos, formando uma equipe coesa e corajosa. Diferenciava-se de tudo que existia em matéria de heróis e seriados até aquele momento. O sucesso de Goranger nas telas nipônica fez com que a TOEI investisse na produção de outras séries Sentai, ainda no final da década de 70, e inicio de 80. Por isso, foram lançadas em seqüência, JAKQ (1977), Battle Fever J (1979), Denziman (1980) e Sun Vulcan (1981), todas com grande aceitação. Logo o público japonês já estava adaptado com o novo estilo de seriado Tokusatsu, onde os heróis vestiam-se com uniformes coloridos e diferenciados, e possuíam características distintas entre si. A união fazia a força em uma equipe Sentai (literalmente). Não havia espaço para egoísmos e individualidade, no time de heróis, pois todos lutavam em prol do mesmo objetivo (mesmo que de formas diferentes às vezes): a paz na terra.O sucesso das séries Sentai, deu impulso a toda a programação de Tokusatsu da TOEI, que mais tarde viria produzir novos gêneros de programação, como as séries Metal Heroes. As equipes de heróis coloridos viraram febre nas telas japonesas, e começaram a ser produzidas anualmente, sem interrupção. Logo passaram a ser comercializadas para o Exterior, vindo para o ocidente rapidamente.
Os Changeman em ação com sua Power Bazuca: sucesso de audiência no final dos anos 80.
As séries Sentai chegaram ao Brasil no final dos anos 80. Foram exibidas em nosso país apenas 4 seriados (Goggle V, Changeman, Flashman e Maskman), que ficaram no ar na TV aberta entre os anos de 88 e 99, variando entre canais como a TV Manchete, TV Bandeirantes, TV Record e CNT Gazeta. O sucesso dos esquadrões coloridos em nossas terras foi estrondoso, principalmente no que diz respeito a Changeman e Flashman. A televisão brasileira foi sacudida por um tipo de programa nada convencional para seus padrões, e o sucesso entre o público infantil da época (hoje em sua maior parte adulto) foi quase instantâneo. Em todo mundo, as séries Sentai fizeram relativo sucesso quando foram exibidas, como nos EUA, e principalmente na França, onde Bioman teve grande popularidade.

O volume de seriados Sentai produzidos, como já foi dito, passou a ser anual, e assim a quantidade e variedade de temas para cada equipe começou a crescer vertiginosamente. Esquadrões que lutavam contando com a ajuda de poderes diferenciados passaram a ser cada vez mais comuns. O uso de técnicas específicas como a Força Terrena em Changeman, o Poder dos Prismas e Planetas em Flashman, ou a Aura Mask em Maskman, se tornaram algo comum entre as equipes.
A partir da metade da década de 90, a empresa americana SABAN Entertainment passou a negociar direitos de comercialização das séries Sentai junto a TOEI. Os acordos eram simples: as séries começaram a ser vendidas a SABAN, que fazia uso de quase todas as cenas de ação e batalhas com robôs, e improvisava o restante da produção com uma equipe de atores americanos. Nascia então, a mais famosa adaptação dos seriados Sentai no planeta: Power Rangers. Foi um marco na história dos seriados Super Sentai (querendo ou não). Tudo passou a ser encarado de uma forma distinta.
O SENTAI:Zyuranger (1993) a série foi vendida e adaptada, para dar origem a 1ª Temporada de Power Rangers nos EUA.Durante o final da década de 90, as séries Sentai deixaram de ser exibidas no Brasil, e foram substituídas pelas temporadas regulares de Power Rangers, na TV aberta, que exibiam quase simultaneamente suas versões adaptadas dos seriados Sentais exibidos em Tóquio. Assim, enquanto a cada ano era exibida uma temporada Sentai nas telas japonesas, uma temporada PR (Power Rangers) era exibida em nosso país.
Go Go Five (1999) que nos EUA ficou conhecido como “Power Rangers Lightspeed” (”Power Rangers: O Resgate”, no Brasil).
Em 2001, a SABAN foi vendida a Disney, após enfrentar série crise financeira, vindo a finalizar a produção da temporada Power Rangers Força Animal (Gaoranger, no original japonês). A Disney consolidou definitivamente o acordo financeiro que a SABAN tinha com a TOEI, fechando contratos de compra de seriados Sentai anualmente, a valores exorbitantes (e não divulgados), e dando assim continuidade a produção das temporadas PR.
Chegamos agora ao ponto principal do debate. As séries Sentais estão ficando infantis, ou essa opinião apenas varia de acordo com a idade do telespectador?
Depende do ponto de vista em que são analisadas.
A partir do instante em que os Sentais começaram a ser negociados com os EUA, e as séries Power Rangers começaram a ser produzidas, uma mudança de política ocorreu sobre o produto comercializado (Sentais). A censura na TV americana é bem maior e mais agressiva que na TV japonesa, em relação aos programas considerados “infantis”. Power Rangers faz parte de um conjunto de programas televisivos considerados “infantis” pelo sistema de mídia televisiva americana; por isso, é natural que sofra cortes e adaptações de várias formas, de acordo com a cultura em que é exibida (no caso, a americana). Uma vez censurada, e ainda estando sob comercialização de empresas americanas e japonesas, as séries Sentais passaram a sofrer mais influência no que diz respeito a seu conteúdo. Sendo adaptadas e exibidas na TV americana, os seriados coloridos passaram a ter de ser mais “adaptáveis”, “fáceis” de serem “trabalhados” pela Disney, sua atual compradora. Para poderem ser perfeitamente moldadas ao estilo de cultura norte-americano, as séries Sentais produzidas pela TOEI tiveram de ser mais “supervisionadas” em suas próprias versões japonesas; assim, torna-se mais fácil suas adaptações para a produção das temporadas Power Rangers, já que sendo mais “inocentes” o número de cortes e o volume da censura tornará-se menor nos EUA.
Dessa forma, chega-se a uma resposta para a pergunta inicial desse artigo: SIM. As séries Sentai, estão de certa forma, não infantis, mas mais amenas, em seu conteúdo. Já não há mais a carga de drama e ferocidade que se assistia nos Sentais dos anos 80 e 90, por exemplo, onde os heróis sofriam de formas mais explícitas e comoventes. As séries Sentais atualmente investem em diretrizes diferentes, que não trilhem caminhos tão dramáticos. É comum, encontrar-se tons de comédia nas equipes de heróis, com pitadas de humor pastelão e tons de enredo já repetitivos. O próprio perfil dos atores modificou-se: baixou-se a faixa etária dos integrantes das equipes. Não se busca mais atores maduros e experientes, como nos anos 80. A “moda” da vez é investir-se em atores adolescentes, e novos no mercado de TV japonês, que representem o público infanto-juvenil e consumista de Tóquio, capaz de comprar produtos do seriado nas lojas do país.
Atores jovens, e quase adolescentes, formando a nova tendência do mercado japonês.
Toda a lógica de produção dos Super Sentais modificou-se. Em parte devido aos acordos comerciais realizados entre EUA e Japão…em parte devido a própria mudança na evolução do tempo. Não se vive mais os anos 80.Todavia, isso não quer dizer que se deva eleger Power Rangers como “o vilão” da história, pelo fato dos Sentais estarem mais brandos ou amenos em seus conteúdos. É inegável o fato de que Power Rangers contribuiu e ainda contribui para a mudança no caráter dos Sentais na atualidade. Mas as próprias séries japonesas ainda guardam seus pontos fortes, principalmente no que diz respeito ao caráter e a formação educativa do enredo e de seus personagens, seja japonês (Sentais) ou americanos (Power Rangers), apesar das diferenças lógicas de cultura.
A série BIOMAN não foi exibida no Brasil, mas ficou famosa pelas cenas “violentas” e fortes e mudanças no visual da equipe, características típicas dos anos 80.
São essas diferenças que fazem milhares de jovens, adolescentes e crianças, que acompanharam as temporadas de Power Rangers quando mais jovens, procurarem as versões originais das séries Sentais atualmente, seja pela Internet, por TV por assinatura, ou mesmo DVD´s. A curiosidade em relação ao que parece ser algo bem mais abrangente, leva esse público mais jovem a engrossar as filas de fãs de Tokusatsu que nascem a cada dia no Brasil e no mundo. Por isso, a “infantilização” do gênero Sentai, deve ser encarada como um novo inicio, de formação de novos fãs, para o Tokusatsu como um todo; a semente de uma nova era que se inicia por caminhos diferentes daqueles que nós, mais velhos, fizemos pela TV aberta nos anos 80. Aprender a conviver com as mudanças (que são inevitáveis), e principalmente com as diferenças é o papel dos fãs de Tokusatsu com 20 ou mais anos de idade, ao lidarem com os novos fãs, que representam um novo fôlego ao gênero tão querido por milhares de brasileiros.

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